Coluna do Jornalista Marcus Prado
Falta uma urna no clube O Leão
Os brasileiro e o mundo esperam que Obama seja capaz de exportar a sua ambição de mudança. A tempo de salvar milhões da fome, da tirania, do ex-tremismo e da violência.
De onde escrevo, de passagem por minha terra natal, a Vitória de Santo Antão, não quero me sentir como uma ilha isolada. Penso nesta hora na Somália, como se o seu povo fosse o meu, esse mesmo povo dos bairros e lugarejos vitoriense mais humilhados pelo abandono cruel e covarde dos mandatários da política. A mesma Somália dos bairros do Irã, Iraque e Malvinas vitorienses mostrados (aos arrepios e espantos) pela Rede Globo. Na verdadeira Somália há caos, fome, senhores da guerra, tribunais islâmicos. Não há Governo, não há comida, não há justiça, como nos três bairros vitorienses. Mas há telefones. E foi por telefone que Asha Dhuhulow explicou ao pai que ia morrer. Executada por lapidação. Tinha 14 anos.

Foi na semana passada que a curta história de vida de Asha se transformou numa história de morte. A família enviara-a para Norte e para longe do campo de refugiados onde nasceu, na esperança de lhe conseguir melhores cuidados médicos.
A viagem foi interrompida em Kismayo, cidade do Sul da Somália, entretanto tomada pelas milícias Al Shabab (A Juventude), organização terrorista com ligações à Al Quaeda. E o que deveria ter sido um julgamento de três homens pela brutal violação de uma menina, transformou-se numa farsa para condenar uma adúltera.
Como é hábito, a execução foi pública, tendo sido arrebanhada uma pequena multidão de deserdados e famintos para o estádio local. Alguns revoltaram-se contra o horror com que os confrontaram. Foram silenciados a rajadas de metralhadora. O ritual prosseguiu. Cinquenta homens rodearam Asha, enterraram-na até ao pescoço, para a imobilizar, e cobriram-lhe a cabeça com um capuz. E assim a mataram. À pedradas.
Se o Mundo pudesse votar, Barack Obama seria presidente dos Estados Unidos da América. Meu voto seria prá ele, na Vitória de Santo Antão, onde sempre voto nas eleições, naquela urna que colocaram no finado clube O Leão – bichinho banguelo, feio, sem pelos nem tesão, que não ruge, virou casa de festejos. Por uma dúzia de boas razões eu votaria nele naquela urna do Leão. Mas também por ser negro. E assim se demonstrar que é possível quebrar o preconceito racial e, associado a ele, um destino de pobreza e de falência. Falta uma urna no clube O Leão.
Filho de um queniano, tem neste país [e no continente] de "origem" um apoio quase incondicional. Não será o novo messias, mas é visto como o homem que poderá assegurar um Mundo mais pacífico. Notícias desta semana davam conta da ameaça de fome que atinge vários países do chamado Cone de África - Quénia e Somália incluídos. 18 milhões de pessoas enfrentam aquela que se poderá tornar, nos próximos meses, segundo os relatos que chegam da zona, na pior tragédia humanitária da década. E o que dizem as estatísticas do Brasil, de Pernambuco, do Nordeste, da Vitória de Santo Antão? Uma coisa não se esconde: o terceiro maior índice de desemprego de PE é nesta cidade. O maior índice de consumo de maconha no interior de PE, está entre Caruaru, Vitória e Gravatá.
Não é provável que o extraordinário carisma de Barack Obama seja suficiente para inverter a hipocrisia que habitualmente se move a política internacional. Mas é ainda assim razoável esperar que exporte, para fora dos EUA, a sua crença e a sua ambição de mudança. Já será tarde para Asha. Mas pode ser que seja a tempo de salvar milhões de pessoas da fome, da tirania, do extremismo e da violência.
Não sei se é pedir muito, mas gostaria que se realizasse nessa cidade uma manifestação pública em solidariedade à campanha de Obama. É a vez de a gente voltar a ouvir oradores como Paulo Roberto e Pedro Queiroz. É importante lembrar nesta hora as palavras contidas no pórtico do famoso romance de Ernest Hemingway; POR QUERM OS SINOS DOBRAM: "nenhum homem é uma ilha isolada. Os sinos dobram por ti também". A dor de Ashsa doeu aqui também.
Marcus Prado é jornalista profissional, vice presidente do Conselho Estadual de Cultura , diretor executivo das Edições Rubroveio.

1 Comentário:

JOsenlda Alves disse...

Profundo...
Meu voto seria dele também, pela dignidade, pela quebra de paradgmas, pela igualdade, no sentido amplo da palavra.
Omundo, e até mesmo os Estados unidos, estão cansados de situações pré-moldadas e pré-fabricadas!
A maior prova disso se deu nas urnas - e nas ruas! - a população do pais mais poderoso do mundo, cansou de seus próprios moldes e rendeu-se à esperança, se não de paz, mas, pelo menos de mudanças!
E aqui eu também acredito:
Yes, we can change!!!!!
Abraços,
:)

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