A cúpula do G-20 em Londres, na quinta-feira, será o palco de um embate entre a União Europeia (UE), que defende a criação de um sistema global de regulação do mercado financeiro e de suas instituições, e os EUA, que insistem na adoção de receitas domésticas de controle do setor. O Brasil, que tem a oferecer a bem-sucedida experiência de um setor financeiro nacional muito normatizado pelo Banco Central, vai se aliar à UE contra a "regulação caseira" ao gosto americano.
Salvo propostas emergenciais de última hora, como a criação de um fundo de US$ 100 bilhões para reativar o financiamento ao comércio, os líderes do G-20 terão poucos, porém complicados, imbróglios a resolver em Londres. A reforma do Fundo Monetário Internacional (FMI) foi decidida duas semanas atrás - nesse debate, o Brasil está alinhado com os EUA -, assim como a injeção de mais recursos nessas instituições para o socorro das quebradas economias do Leste Europeu. Caberá aos líderes definir quanto será aportado - se US$ 500 bilhões ou US$ 750 bilhões - e quem pagará a conta.
O governo brasileiro chegará ao encontro com um poder de ação alargado pela sua inclusão no Comitê de Basileia de Supervisão Bancária e no Fórum de Estabilidade Financeira (FSF, na sigla em inglês), além da perspectiva de aumentar seu poder de voto no FMI e no Banco Mundial (Bird), ao final de suas reformas levados a cabo com amplo aval dos EUA. "O Brasil terá no G-20 um papel condizente ao seu tamanho", avaliou ao Estado o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim.
O acúmulo de aliados, entretanto, não diminui o desafio da UE. Neste seu primeiro encontro multilateral, o presidente dos EUA, Barack Obama, deve resistir à regulação global do sistema financeiro escudado em duas iniciativas tomadas pelo Tesouro americano na semana passada: o superpacote de US$ 1 trilhão para a compra de "ativos tóxicos" das suas instituições financeiras, e a decisão de pedir ao Congresso a ampliação de seu poder de regulação e supervisão dos bancos.
Com tais munições, os EUA tendem a defender que cada País faça a sua vigilância bancária - a "regulação caseira" -, bloqueando o consenso em torno da proposta de conversão do FSF, que atualmente coordena os debates sobre a recuperação do setor, em uma espécie de "inspetor mundial" das finanças. O FSF poderia examinar periodicamente as políticas macroeconômicas e financeiras nacionais, inclusive as dos países ricos, como a OMC faz com as políticas comerciais dos sócios.
Outra proposta prevê a adoção de uma política anticíclica para evitar que os sistemas de crédito evoluam da pura euforia para depressões em que o crédito evapora por completo. No momento de maior liquidez, os países adotariam travas duras no controle da qualidade do crédito. Há ainda a recomendação para que os bancos sejam transparentes na oferta de produtos financeiros - não escamoteando, por exemplo, a toxicidade dos "subprimes", os títulos podres da indústria das hipotecas habitacionais nos EUA.
"Os EUA têm sido, tradicionalmente, mais reticentes a qualquer tipo de supervisão externa sobre suas finanças e a macroeconomia", disse Amorim. "Será um embate de princípios: o do estímulo à concorrência (EUA) contra o da maior regulação (UE)", disse uma fonte da equipe econômica.
Fonte: O Estadão
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